O Hip Hop salvou a minha vida. Gostaria de poder exibir essa frase no meu mural do Facebook ou usar como exemplo quando falo com os rappers mais novos, mas não o posso fazer porque não corresponde à verdade. O Hip Hop não salvou a minha vida, muito menos o Rap, pelo menos não da forma que eu consideraria um salvamento. Eu gosto de dizer que a cultura de rua me deu um bom motivo pelo qual viver, pelo qual acordar todo dia e por muito tempo respirei isso. Ainda respiro, como oxigénio, mas em doses normais, tal como disse o blogger Guilherme Junkes.

Mas cada caso é um caso, o Hip Hop pode inspirar qualquer um a alcançar grandes coisas e trilhar um caminho de sucesso. Basta olharmos para alguns exemplos que temos por aqui, casos como o de MCK que ganhou visibilidade fora da música e a nível internacional (e não só) devido ao Rap mais político e interventivo que carrega consigo.

Graças à internet, a música hoje tornou-se mais abrangente, é cada vez mais fácil encontrar a música do teu cantor favorito, desta forma os artistas conseguem espalhar mais e mais músicas que inspirem quem as ouve, músicas que têm o poder de alterar a vida de alguém.

Nesta ordem de ideias, perguntei a alguns artistas da nova escola que álbum ou música mudou a sua vida, ou teve um grande impacto nela. Irão se surpreender com algumas respostas abaixo:

Young Double

“Eu gostava muito de R&B e quando ouvi o Numb/Encore pela primeira vez vi beleza na forma como as palavras eram articuladas. Foram as primeiras barras de rap que decorei na vida, o Jay me fez olhar para o rap de forma diferente. Negócio Fechado me fez perceber que em português também se podia fazer e bem feito, Angolan Dream Boy foi a primeira vez que senti que podia cruzar a sonoridade do rap em português com uma mais ousada e internacional, na minha opinião é o clássico do Cage One e um dos clássicos rap angolano!!”

Olibreezy

“Mudou a minha forma de olhar para as dificuldades, ensinou-me que não tenho sempre de analisar tudo tendo como base apenas o meu ponto de vista, SMS ft. Janice Tiana fez-me olhar para as amizades de uma forma mais rica, ajudou-me a explorar outro modelo de interacção no que toca a amizades femininas, e saber que quem me estava a passar tamanha carga motivacional era um jovem da minha faixa, foi simplesmente reconfortante, e é um álbum que me lembra bastante a minha transição evolutiva enquanto indivíduo, eu cresci com este trabalho.”

Soldier V (Fat Soldiers)

“Esse álbum em particular teve uma influência muito grande sobre os meus gostos musicais no que toca ao rap em português e despertou em mim a consciência crítica, me fez descobrir o meu propósito no rap. Não que não tenha escutado nada de rap de intervenção social antes, a música M.P.L.A levou-me a ouvir o álbum todo e fui revirando tudo o que tinha a ver com o rap dessa linhagem”

Bráulio David Rimas

“Na época em que este álbum saiu eu estava a começar a gostar de rap, foi a primeira vez que tive contacto com o rap nacional e algumas músicas deste álbum me marcaram, como por exemplo Conselho de Amigo. A forma simples de escrever, a musicalidade, os coros lixados do Heavy C, enfim, abriu-me as portas para as coisas que vinham pela frente.”

Mendez (MOB)

“Depois de ouvir o Me Against The World, o meu interesse musical foi todo direccionado para o rap, parei de ouvir outros estilos. O The Carter 3 é para mim um dos álbuns de rap mais bem estruturados até hoje e daí surgiu a estrutura das minhas mixtapes. Quando O Kumbu Cair descreve literalmente a minha infância e motiva-me a trabalhar para não voltar a esse tempo de miséria.”

Phedilson

“Esses álbuns me marcaram não somente pela qualidade lírica dos rappers em questão, mas muito mais pela influência que os mesmos tiveram em mim como adolescente.
Contribuíram para que eu tivesse a visão que hoje tenho sobre o mundo, tanto no contexto social, político como na minha vida pessoal. São álbuns que de alguma forma fizeram jus ao facto de o Hip Hop/rap ser um elemento importante na educação juvenil quando consumido e interpretado correctamente.”

Lizzy

  • Born Sinner (J. Cole)

“A música em questão fala dos nossos medos enquanto artistas, o nosso desespero em tentar agradar a outras pessoas, as labels, as lendas, e perdermos o verdadeiro caminho que  é espalhar a mensagem que sai do nosso coração, porque na realidade somos imperfeitos e mais do que isso, nascemos pecadores. Ainda, porque, o negócio da música é complexo é uma espada de dois gumes quando fazemos a jogada errada, mas mesmo com esses dramas é uma bênção dada por Deus, porque é através dela que espalhamos a mensagem contra a injustiça social, contra qualquer tipo de descriminação, e dar a esperança que virão melhores dias. E também, pelas dúvidas que surgem enquanto pecadores que somos, entre discernir o certo do errado, as pessoas em quem confiar, namoradas e amigos em quem confiamos os nossos medos e segredos, estes que estão connosco no momento de ascensão, mas possivelmente podem desaparecer na época de uma eventual queda. São esses dramas de quem nasceu pecador e por cima disso é um artista.”

Leonardo Freezy

“Teve um grande impacto na minha vida porque comecei a ouvir num momento em que me sentia ou achava que não tinha uma identidade própria, ou seja, uma ideologia aceitável para o meu meio social E o Diário de Marcos Robert e o próprio Bob da Rage Sense na sua abordagem ilustrou-me pontos em que eu podia aceitar-me tal como era/sou e cada faixa na verdade era e é até hoje uma lição de vida e sem dúvidas uma grande fonte de inspiração em termos de composição para mim. Aquilo era mesmo bué real, sentia que cada faixa estava a ser escrita para mim, foram revelações surreais mesmo.”

Gold Black

“Já ouvi muitos álbuns e músicas, por isso é realmente difícil responder com justiça, contudo, esses dois álbuns excepcionais na minha óptica separaram o sumo do supervacâneo. O álbum da “Bruxa” saído em 2006, numa altura em que eu era um adolescente a tentar perceber a realidade à minha volta. Relativamente à música que mais me marcou, posso referir o som “Nossos Tempos” do álbum “Educação Visual” de Valete, que saiu em 2002 mas que só chegou até mim em 2005/2006. Escolhi este som pela agudeza de conteúdos, pela mensagem social sui generis, que contribuiu muito para a minha maturação intelectual.”