Heavy C, natural de Benguela, trabalha há dez anos na produção musical. Nos bastidores dos palcos tem contribuído para o sucesso da carreira de artistas como a Pérola ou a Ary (só para citar dois nomes mais sonantes). Lançou o seu terceiro álbum a solo intitulado Não Larga o Amor.
Em simultâneo fez a sua estreia literária com o livro Quando a Mulher Se Cansa. São dois trabalhos corajosos que põe o dedo na ferida sobre os problemas que afectam as relações amorosas tais como a infidelidade. Conheça o percurso de carreira de um dos músicos mais populares da actualidade.
Quem é Carlos Furtado e de onde surgiu o nome Heavy C?
Comecei a dar os primeiros passos na música em 1993. Cantava muito com o meu irmão Jemilson Furtado desde que acordávamos até à noitinha — quando íamos deitar o lixo. Na altura era muito difícil singrar na música, eu contentava-me a ver os amigos que tinham essa possibilidade e aprendia com eles, sem nunca desistir. Em 1996, o meu irmão atribuiu-me o nome de Heavy C — “heavy” por significar pesado, em inglês, e na altura eu era muito avantajado em termos de peso. O “C” vem do meu nome próprio Carlos.
Entrar para o mundo da música sempre foi o seu sonho. Como foi que isso aconteceu?
Conheci primeiramente o Alile, um grande músico que fazia teclados na banda da cantora Célia Sambo e com Delio Guimarães, o filho do conceituado cantor Sabu Guimarães. Também fui influenciado pelo nosso falecido e consagrado Mónica Zangado, que me ensinou a trabalhar com o teclado que tinha na altura, um XP 60. Em 1999 assinei a minha primeira obra com Eduardo Paím
Como surgiu a Buedbeats?
Em 2001 fui estudar para Capetown, na África do Sul e conheci o grupo Army Squad. Como já tinha laços fortes com o amigo e músico Negrobue decidimos formar a Buedbeats. No ano seguinte a Pérola e a Marita Vénus entraram para o team. Cada um lutava à sua maneira com o intuito de sermos uma família e singrarmos juntos. Em 2002 saíram todos esses projectos.
Quais são as pessoas que fazem parte da Buedbeats?
Em Angola já se pode viver da produção musical? Hoje, a Buedbeats já não prima por ter muitos artistas. Preferimos ter poucos, que produzam muito. Por exemplo, o Heavy C, Pérola, Ary, Londa, Sari, Iveth, Carmen Guerreiro ou Mohamed. Eu vivo estreitamente da música. Penso que se fossem dados mais apoios às produtoras, a música angolana tomaria passos ainda mais sérios.
Qual é o processo de selecção dos vossos artistas?
O artista tem uma primeira sessão de audição vocal. Desta forma saberemos até que ponto podemos explorar um artista e avançar com o seu projecto. Temos dois moldes de trabalhar. Há os artistas produzidos e apoiados pela produtora e os artistas que solicitam os nossos serviços.
A Buedbeats tem fama de ser uma das produtoras mais caras do mercado? Porquê?
Ser caro é relativo. Quem quer fazer da música uma carreira decerto não tem essa opinião.O nosso nível de vida encarece mais e isso não depende de nós como produtora.
Quantos álbuns já foram produzidos pela Buedbeats?
Marita Vénus, Army Squad, Negro bue, Pérola (dois álbuns), Yola Araújo (2 álbuns), Yola Semedo, Ary, Heavy C (cinco albuns) e a Londa Sabino.
E quais os projectos que tem em carteira?
Sarissari, Cármen Guerreiro, Iveth Galiano e Buedbeats Volume 1.
Sente-se realizado como produtor? Já chegou aonde sempre sonhou? O que falta?
Um homem nunca se sente realizado. Ainda tenho muito a aprender. Quero focar-me mais na nossa cultura. Sou muito exigente com os artistas. A nossa cultura tem força. Pode ser uma potência. Não me canso em afirmar isso. Faltam mais apoios, muito mais apoios. Eu sonho com uma Angola no Grammy Awards. Como produtor qual é o seu maior sonho… O músico de quem gostaria de fazer pelo menos um tema seria o André Mingas. Já existem muito produtores musicais a trabalhar em Angola.
Mas há alguma escola onde eles possam aprender a executar o trabalho com profissionalismo?
Existem escolas. Acredito que elas vêm fazendo o seu papel na nossa sociedade. Mas as escolas também precisam de ajuda. Eu sou uma das pessoas que indica essas instituições a alguns artistas. Por vezes até sou mal interpretado por isso.
Recebem algum apoio do Ministério da cultura?
Não!
Quantos álbuns é que o cantor Heavy C já lançou?
Tenho cinco álbuns no mercado: Chegamos (2000), Custou (2002), Heavy (2006), C (2006), Não Largo o Amor (2009).
A que se deve o intervalo de tempo entre cada álbum?
Esse intervalo dá-nos tempo para analisar o mercado e o comportamento do consumidor. Para que tenhamos um bom produto, a um bom preço, num bom lugar e com uma boa promoção.
Fale-nos do último trabalho?
Não Largo o Amor é uma obra focada na nossa população. Na minha vivencia, na vivência do vizinho, e não só. Fui ao fundo. Pesquisei temas ouvi, vi, calei e decidi fazê-lo. Há poucas participações de artistas— Pérola, Sarissari, Yuri da Cunha e Karoline. Tive ainda a ajuda dos produtores Jorge Cervantes, Jerry Charbonnier, Kriptonic.
O resto feito por mim. Qual foi a sua fonte de inspiração?
A nossa Angola.
Também teve de andar atrás de patrocínios?
Sim. Também tenho os meus entraves. Decerto não tão graves como outros artistas. Mas no que diz respeito à promoção preciso sempre de apoios. Por exemplo, a minha primeira obra contou com o apoio do Eduardo Paím e de um tio que decidiu dar um voto de confi ança à minha carreira. Caso contrário, seria complicado. Fala muito sobre o amor…
O que é o amor para si?
Doce e amargo, alto e baixo, estrela linda e sem luz, pobreza e riqueza, sorriso e lágrimas, estratégia e negócio, dinheiro e loucura, inconsequência e ternura. Amor, traição, perda, não dar valor a quem o ama, canta muito sobre isso.
Na sua opinião porque muitas relações não dão certo?
O a
companhamento é necessário. Temos que ser mais atentos com o próximo e ter em mente que apreendemos todos os dias.
Quem trai mais hoje: os homens ou as mulheres?
Os dois. A traição não é somente a troca de parceiros. É algo muito mais profundo. Amar e viver faz parte de um kit difícil de ser gerido. Temos que conversar, aconselhar, trabalhar o amor. Mesmo entre a familia podemos abordar temas polémicos e derrubar tabus. Já viveu tudo que canta? Nem tudo. A maioria, sim… (risos)
Acha que o verdadeiro amor esfriou em relação ao tempo dos nossos avós?
O que mudou nos relacionamentos? Os tempos eram diferentes. Hoje há a globalização. Em qualquer época, porém, o diálogo é a chave. Não só a dois mas também a muitos. Não façamos só reuniões para fazer dinheiro ou discutir problemas. Vamos falar das nossas vidas, num ciclo de verdade, sem falsidade, de modo a corrigirmos os nossos erros. Todos precisamos de ajuda. Ninguém está ausente da tentação. Eu também quero ajuda e estou à procura dela e sei que vou encontrar. Sabemos que é um homem casado.
O que encontrou no seu casamento? Paz, estabilidade, maturidade?
Sim. Mas ainda há muito por desenvolver não só em mim e não só nela. Temos um ponto comum de entendimento e acredito poder desenvolvê-lo ainda mais. O que significa para si a sua esposa…. Mãe, irmã, parceira, sócia, etc. A definição é muito vasta…
É um pai presente que acompanha o dia-a-dia dos seus fi lhos ou o tipo de pai que só paga as contas?
Hoje em dia todos nós saímos cedo e vamos para a luta. Logo, infelizmente, nem sempre estou presente. Mas nunca seria um pai de “ouvir dizer”. Eu faço tudo pelos meus fi lhos. O amor que nutro por eles não tem barreiras. Não quero que amanhã eles me acusem de não lhes ter dado uma educação salutar.
Os seus pais estão orgulhosos da sua escolha de vida? De não seres o Dr.º Carlos Furtado, mas sim o Heavy C, reconhecido em toda a Angola pelo seu trabalho?
Por acaso no próximo ano já serei o Dr. Carlos Furtado. No principio a minha mãe não achou piada ao facto de não ter seguido uma carreira “normal”. Depois apoiou-me, como sempre. Mas não posso negar que a licenciatura foi um prazer que quis proporcionar à minha mãe.
É sedutor ou seduzido?
Ambos. No seu concerto vimos uma fã que quebrou o protocolo e se atirou nos seus braços.
Como reagiu?
Sinto-me bem com o carinho do público e não há nada que pague isso. Essa espectadora foi muito corajosa. Tenho muito respeito pelos fãs. A segurança tem a função de me proteger, mas às vezes exagera. Não gosto que os fãs sejam maltratados. Mas essa menina foi determinada e claro eu gosto de ser abraçado.
Sente-se famoso?
Não. Sou apenas popular.
É fácil lidar com esta fama?
Não é fácil. Temos que ser muito cautelosos e serenos com a fama.
Como é que a sua esposa lida com as suas fãs?
A minha esposa não se importa. Já se habituou.
Alguma vez foi difamado? Qual foi a maior mentira que já ouviu sobre si?
Já fui difamado muitas vezes. Dizem que roubo dinheiro dos cantores, que não sou que escrevo as músicas. Agora há uma nova: que roubei a musica de um grupo de rap (risos).
É ciumento?
Sou extremamente ciumento. Tenho muito medo de perder quem amo.
A família o que é para si?
Tudo.
Entre discotecas e festas?
Festas.
Sabe cozinhar. Ajuda nas tarefas domésticas?
Sei cozinhar sim. Mas não tenho muito tempo. Não gosto de engomar (risos).
Prato preferido?
Peixe carapau grelhado com mandioca, batata doce.
País dos sonhos?
Angola… organizada.
O que Deus significa para si?
Deus é o mesmo que família. Já passou pela minha cabeça cantar somente para Deus. Mas estou a deixar esse veia evangélica ganhar mais espaço antes de a atacar.
O que nunca se esquece de levar consigo?
O relógio. Sou muito conectado no tempo
Defeitos e qualidade?
Teimoso, conselheiro.
Sabemos que fez uma lipoaspiração. Aconselha as outras pessoas a fazê-la?
Fiz uma redução do estômago, não uma lipoaspiração. Mas não aconselho as pessoas a chegarem até esse ponto. O melhor é controlarem o seu ritmo alimentício. A cirurgia é uma interrupção muito brusca para um ser humano. É melhor evitar, que remediar.
Hoje segue uma dieta?
Tem o acompanhamento de um nutricionista? Com o ritmo de vida que levo, não posso afi rmar que sigo uma dieta a rigor. Mas já não exagero como antes. Já conheço bem o meu organismo. Sinto-me feliz com o meu estado de hoje mas ainda vou dar mais uma mexidinha no meu corpo retirando os excessos (risos).
Dedica o álbum, ou alguma música, a alguém especial?
Há uma musica intitulada “Sahyra”, que dediquei à minha filha. Ela ficou muito feliz. O mais novo, daqui a nada, vai pedir também (risos) Muitas pessoas estão a identificar-se com a letra da música “Na Tua Mãe” e a terminar relacionamentos.
Essa história aconteceu com alguém que conheceu?
Não. “Na Tua Mãe” é uma discussão que todos os casais têm. Achei que seria uma maneira de chamar a atenção para o que realmente acontece em nossa casa. Não apelo ao fim da relação mas sim à prevenção.A música é um sinal de fadiga marital que, as vezes, acaba em tragédias.
Para quando um grande espectáculo ao vivo?
Não posso ainda adiantar datas porque estamos a viver uma situação económica pouco estável e dependemos de bancos e outras instituições. Mas teremos o show de Heavy C e da Buedbeats para breve. Posso adiantar que terá as participações de Ary, Pérola, Damásio, Yuri da Cunha e que a banda será uma mistura de angolanos e antilhanos.
Porque é que muitos músicos em Angola cantam em play back nos seus espectáculos?
Eu acho que essa disciplina tem de partir dos próprios músicos. Yuri, Damásio, Paulo Flores têm feito excelentes shows, por exemplo.
Qual foi o evento que mais marcou a sua carreira?
Quando dividi o palco com o Anselmo Ralph. No dia seguinte apercebi-me o quanto avantajado eu estava. Foi aí que decidi fazer a cirurgia. O mercado está competit
ivo.
É importante termos uma escola de música em Angola?
Claro que sim. Estamos numa fase de potencialização da nossa cultura. Não falo só de música mas também de teatro, literatura, artes plásticas, etc. E o Carlos Furtado, escritor… A composição lírica não foge da literatura. Pelo contrário. Há uma ligação. Decidi em casa, com um amigo, escrever um livro. Como sou muito emotivo comecei a falar-lhe de como seria o livro. Ele achou graça e, a partir dai, levei essa aventura sozinho. Fui vendo mais as coisas e aprendendo com elas. Todas as cenas que testemunhava serviam de aprendizagem para o livro.
É um perito nesse assunto?
Não sou perito. Longe disso. Quis apenas dar o meu contributo. Já habituei os fãs pelo lado musical, agora estou a fazê-lo pelo lado literário.
Que recado deixa aos fãs que ainda não leram o livro?
Que adquiram o livro. Poderá infl uenciar as suas vidas e trazer novos horizontes.
Vai haver um próximo livro?
Claro que sim. Quando a Mulher se Cansa, parte 2. A Tereza volta a entrar em cena!
Porque será que as mulheres hoje exageram no consumo de bebidas alcoólicas?
Não sei. Eu não suporto ver uma mulher a beber uma cerveja na garrafa.
Dizem que a nossa sociedade está doente. Concorda?
Sim. Principalmente a juventude.
O nosso país está numa fase de reconstrução e mudança. Qual é o seu contributo?
Não fi co à espera que o Ministério da Cultura resolva os problemas. São dez anos de produção. Sensibilizo os músicos, faço a produção musical, acompanho-os até que a sua obra seja apresentada. Estou envolvido em muitas obras. Hoje também estou no lado literário. Há coisas que não são apresentadas nas músicas e fi cam por ser ditas.
Para fazer download dos álbuns anteriores de Heavy C, clique aqui…